sábado, 17 de outubro de 2009

Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
– dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Agora eu durmo tarde
e acordo tarde
e as tardes são assim
pra mim, manhãs
que passam em velocidade
e ardem como o sol
que arde a madrugada inteira

Eu abro os olhos
eu olho as horas
eu molho os óculos
e ainda é agora

Eu cato conchas na geladeira
eu conto estrelas
depois que o dia nasce

Será tarde?