O Amor (Vladimir Maiakovski)
(Tradução de Haroldo de Campos)
Um dia, quem sabe,
ela, que também
gostava de bichos
apareça numa alameda
do zoológico,
sorridente, tal como
agora está no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela, que,
por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo
Século ultrapassará o exame de mil nadas, que dilaceravam o coração.
Então, de todo amor
não terminado, seremos pagos em enumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me!
nem que seja só
porque te esperava como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me, nem
que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo de casamentos, concupiscência, salários.
Para que, maldizendo os leitos, saltando dos coxins, o amor se vá pelo
universo inteiro.
Para que o dia, que o sofrimento degrada, não vos seja chorado,
mendigado.
E que, ao primeiro apelo: - Camaradas! Atenta se volte a terra inteira.
Para viver livre dos nichos das casas.
Para que doravante a família seja o pai, pelo menos o Universo; a mãe, pelo
menos a Terra.
(1923)